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“Não chame de armadilha”

Focalistic fala sobre independência, esperança e suas origens

Martin Guttridge-Hewitt
Focalistic interview

“Pitori Maradona” é um MC do nosso tempo. No terreno devastado da cena musical afetada pela COVID-19, energia e empreendedorismo não são apenas características valiosas, elas são fundamentais. Essas qualidades não faltam para o sul-africano de 24 anos. Isso sem falar no talento notável, de onde vem parte do nome que compartilha com a lenda do futebol argentino falecida recentemente.

Mais conhecido pelo apelido Focalistic, seu verdadeiro nome é Lethabo Sebetso. Seu primeiro grande sucesso com o hit do Major League DJz de 2018, 19 Tobetsa, quando o novato deixou uma impressão duradoura em todos os que ouviram seu som. Desde então, lançou muitos projetos de destaque graças ao seu trabalho incansável. Foram três singles, um EP e os álbuns Sghubu Ses Excellent e Quarantined Tarantino só nos últimos 12 meses. O compositor acompanha esse ritmo com uma fonte infinita de novas ideias.

Apesar disso, ressalta que essa é uma operação totalmente independente. Ele tem controle total sobre todos os aspectos de cada projeto, sua imagem e trajetória. Com isso em mente, podemos entender por que sua única oportunidade de responder às nossas perguntas veio logo antes do Natal, quando ele ainda estava na estrada após participar da edição de Joanesburgo do Ballantine’s x Boiler Room True Music In The Round. É difícil se desconectar quando é você que comanda o show.

“Acredito que a minha opção de ser independente não foi inspirada em ninguém. Veio da necessidade de estar no controle e ser livre”, diz Focalistic quando perguntamos por que ele decidiu rejeitar as armadilhas da indústria musical padrão, como gravadoras e agentes. Suas palavras remetem à letra de 19 Tobetsa. “Para mim, a música não é como contabilidade ou algo assim. Entende? É algo emocional. Você não pode ter um chefe se quiser ser o mais livre possível. Foi isso que me fez querer ser independente.”

“Não é fácil, mas é importante encontrar o acordo certo. Teria sido mais fácil para mim, internacionalmente, se eu tivesse uma grande máquina trabalhando para apoiar minha carreira, mas será que a música iria tocar as pessoas?”, ele responde quando perguntamos sobre os desafios que enfrenta por fazer tudo sozinho.

Ballantine's boiler room in the round focalistic
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“É sempre importante criar uma base sólida. Depois, você pode ter uma máquina por trás para promover a música, mas a música precisa continuar sendo a mais pura possível.”

A filosofia de Focalistic se baseia no termo “pina tsa ko kasi”, uma versão abreviada da estrutura musical parcialmente definida em  outra colaboração sua com o Major League DJz, a coletânea de 2019 com seis faixas, Asa Trap Tse ke Pina Tsa Ko Kasi, cuja tradução livre significa: “Não é armadilha, é da área”. Com um som que combina gêneros como Balearic com piano, Kwaito purista, Hip Hop e R&B, a mensagem vem antes da estética. O importante é manter a identidade e ser autêntico.

“É isso aí, não é armadilha, é da área. Você precisa usar todas as suas experiências, admitir ou perceber a influência que o local tem sobre você. Para mim, todas as regiões do mundo são iguais, sempre. O que importa é contar minha história e ter certeza de que as pessoas do mundo inteiro consigam entender”, afirma Focalistic, esclarecendo que, embora tenha nascido em uma região, essa filosofia pode ser aplicada a praticamente todos os artistas em qualquer país. “É um movimento, porque todas as pessoas são iguais e todos podem entender. Não é só sobre o que você fala, mas o que você sente.

Muitos garotos querem representar o local de onde vêm, porque é mais natural para eles. Isso está virando moda, ficando confortável. Como sou da África do Sul, quando comecei, tive muita influência da mídia, em grande parte da América, e tentava fazer Rap como os Drakes”, afirmou, antes de se lembrar de uma epifania pessoal e artística, que ajudou a catalisar “pina tsa ko kasi”. “Em um momento da vida, fiquei obcecado com minha própria voz. Quero dizer, ter minha voz, falar sobre minhas experiências, as coisas que me orgulham, como eu cresci. Foi assim que o movimento começou.”

Embora Focalistic declare abertamente suas raízes, mais especificamente a capital executiva da África do Sul, Pretória, a mudança para Joanesburgo ajudou a melhorar sua exposição e perfil. Em um local onde está a maior parte da indústria musical do país, com uma população enorme e, consequentemente, um público enorme, apesar da mudança, ele ainda acredita que os artistas possam ganhar notoriedade em cidades menores. É preciso usar as próprias habilidades de maneira inteligente. “Existem muitas oportunidades fora das grandes cidades, é só uma questão de aproveitar sua base de fãs. Para mim, como muitos sabem, é importante criar músicas sobre o local de onde eu venho. Acredito muito na representação. É isso que faz a música ser única, especial para você.

Ballantine's boiler room in the round focalistic

“Música é uma questão de local, e o local está na música, na cultura, no comportamento. Assim, você tem oportunidade de criar e desenvolver sua identidade”, disse Focalistic, explicando que isso não quer dizer que não existam obstáculos para os artistas regionais. “Na minha opinião, o problema são os recursos limitados. Fora das grandes cidades, faltam recursos para os artistas. Talvez isso leve os jovens artistas a se mudar para uma cidade maior. Por isso, é muito importante nunca se esquecer de onde você vem.”

Essa atitude conta para as pessoas, e não só o lugar. Mencionamos sua amizade com o produtor Herc e ficamos sabendo que ela começou na infância. “Acho que eu estava no segundo ano, e ele veio do primeiro ano do Ensino Fundamental. Somos amigos desde então”, relata Focalistic, revelando a importância das relações e do contato humano para ele, além de explicar como 2020 e a pandemia têm sido desafiadores nesse sentido. “Foi um ano difícil, mas acho que não estamos tão mal quanto as pessoas imaginam. Com certeza, a música se transformou na alegria e na solução que as pessoas precisavam.

“Em relação ao governo, temos que melhorar muito para controlar o vírus e aumentar a liberdade. Por mais que seja necessário ter fechamentos e restrições, não é só o que acontece nas apresentações ou nos festivais que conta”, ele afirma sobre a resposta da África do Sul à COVID-19. “Entende? O vírus também está nas aglomerações nas igrejas, e ninguém fala sobre isso. E quanto às manifestações com mais de 5 mil pessoas? Não podemos tocar para 500. Existe uma desconexão enorme. Também acho desnecessária a brutalidade policial com os frequentadores de festas. Como povo, estamos tentando. É um momento deprimente para todos, e o governo precisa começar a se concentrar no que realmente importa.

“Acredito que, para mudar, precisamos ter uma conexão maior, nos conectarmos mais, contarmos nossas histórias”, ele responde quando perguntamos o que o mundo deve priorizar nos próximos meses. “Meu verdadeiro nome é Lethabo, que quer dizer ‘alegria’. Gosto de espalhar positividade mesmo nos momentos mais desanimadores. Eu gostaria de ser lembrado como a pessoa que contou como o mundo era na época. Estamos fazendo história e vamos fazer parte dos livros de história. Também quero ser visto como uma pessoa que promoveu a família, Deus, a positividade e ganhar dinheiro, inspirando os incansáveis do mundo todo.

“Em 2020, falei sobre o que estava acontecendo comigo. Estou fazendo a mesma coisa em 2021, mas são situações diferentes”, continua Focalistic, antes de encerrar com uma declaração final tão ressonante e pessoal quanto repentina. “Eu cresci muito desde que as pessoas me ouviram pela última vez, porque, como todo mundo, passei por muita coisa. Agora estou indo para a Zâmbia, e essas experiências abriram minha mente de novo. É importante que nossas histórias como africanos jovens e negros cheguem ao mundo, e que as pessoas se identifiquem com elas. Acho que é isso que vai mudar.”

Martin Guttridge-Hewitt é editor da revista Design Exchange e escreve com frequência para DJ Mag, Mixmag, Resident Advisor, XLR8R e The Guardian.

Boiler Room

True Music In The Round

Experiência totalmente nova no True Music, “In The Round” é uma série de eventos transmitidos ao vivo, com distanciamento social, que leva a música ao vivo de volta à vida das pessoas e on-line.

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